27 de janeiro de 2020

, , ,

Em memória às vítimas do Holocausto e o mundo presente


Hoje comemoramos o dia internacional em memória das vítimas do Holocausto. Manter a memória viva é importante e fundamental, em especial no Brasil, onde vemos um advento de revisionismos históricos e falácias a respeito do tema. Mas neste dia gostaria de lembrar da importância da história como forma de estruturação do pensamento no mundo presente. 


O atual sistema social, político e econômico em que vivemos construiu novas formas de opressão humana associando os diversos elos que a envolvem (étnico, cultural, entre outros). O que em parte representou o território de Auschwitz e outros campos de concentração? Faço aqui um dos recortes dentro do todo que foi o horror deste sistema. Auschwitz e outros campos similares se relacionavam e estruturavam territorialmente uma lógica de produção econômica. Sob o discurso racista que embasou o Nazismo justificou-se a criação destes territórios de segregação. Sob a disseminação da construção simbólica racista e eugenia, algo que poderia ser exemplificado com frases atuais como “o índio está evoluindo e tornando-se um ser humano igual a nós”, tais espaços foram concebidos, garantiam mão de obra escrava e descartável ao sistema que alimentavam.


Auschwitz graças a deus não existe mais, resta a memória e a história que não deve ser desconstruída ou desacreditada, porém mil formas de territorializar e oprimir o povo se mantém firme e em diálogo com os sistemas econômicos. Campos de refugiados, Guantánamo, ou quaisquer presídios brasileiros que acumulam pessoas sem sequer o primeiro julgamento, todos apontam como arquiteturas destinadas a um nível extremo de opressão da humanidade.  Se o campo de Auschwitz e similares serviram a um sistema de desenvolvimento dentro de um projeto nacional racista, não podemos negar o quanto de campos e disputas territoriais atuais podem servir ao mesmo processo, porém dentro de uma conjuntura econômica diferente onde a violência gera e retroalimenta inúmeros mercados.

As guerras (tanto entre nações como intra-territórios) seguem padrões semelhantes, criam a terra arrasada e depois abrem o espaço para que o grande investimento entre nestas terras, este é o espólio que se sobrepõe aos direitos dos povos de habitar, pertencer, vivenciar e conceber seus lugares. A desterritorialização de povos se tornaram parte de um braço rentável para o capital, seja por exemplo os campos de refugiados de Gaza que hoje se transformaram em verdadeiras cidades, ou os campos de refugiados sírios situados na Jordânia. Cada qual se adequa a uma forma de exploração da opressão humana dos povos sem lugar que tiveram suas vidas e histórias dilaceradas.

As últimas infames falas de nossos líderes de governo Bolsonaro e seu secretário de cultura trouxe ao salão a necessidade de debatermos o Nazismo e Fascismo de forma séria, e isso trouxe as redes novamente o filme arquitetura da destruição. O centro do filme demonstra como o sistema capturou o simbólico e reconstruiu a estética ao se impor na população. Esta construção de pensamento se capilariza na sociedade e se torna parte do discurso cotidiano da mesma, isso se potencializa em um país como Brasil, que não conseguiu por exemplo romper suas ferramentas de segregação e seu racismo estrutural.


Assim que palavras como a de Bolsonaro, apontando claro discurso de eugenia com relação a indígenas, ou de Alvim parafraseando Goebbels, podem chocar a muitos de nós. Estas declarações, e mais, suas ações não necessariamente afetam os mercados ou o cotidiano a ponto da queda completa do sistema. Os índios que segundo Bolsonaro “não são gente evoluída” por sua vez não serão tópico de “uma arte heroica” mereceriam o direito ao território que tem ou este território poderia ser melhor utilizado com a exploração sustentável dos ecoplans do BIG?  Enquanto isso, Bjarke Ingels se justifica aos brasileiros:

“Não podemos esperar que todas as instâncias públicas estejam alinhadas com todos os aspectos de nosso pensamento, mas podemos garantir que possamos trazer a mudança que queremos ver no mundo através do trabalho que realizamos“, afirma Ingels na nota." 

A nota de defesa de BIG não traz nenhum estranhamento a quem observa os caminhos do mercado internacional da arquitetura de forma crítica. Seu projeto para o Brasil por sua vez não se importa com o genocídio indígena ou as queimadas na Amazônia. Assim, aponta um imenso anacronismo ao defender intervenções ecologicamente sustentáveis junto a um governo que defende abertamente o inverso. Obviamente muito mais suave que o nazismo não quero fazer tal comparação com o BIG, porém sua defesa aponta para argumentos semelhantes aos apresentados no tribunal de Nuremberg, com uma grande diferença: BIG é um escritório liberal que pode dizer não ao Bolsonaro, diferente dos soldados que apenas recebiam ordens.Remeter a memória das vítimas do Holocausto é se dedicar para que novas vítimas e novos Holocaustos não mais aconteçam.