1 de maio de 2018

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Direito a moradia e cidadania

Alguém deveria lembrar ao governador de São Paulo, Márcio França, que direito a moradia DIGNA (isso não se soluciona com casinha no meio do nada como o MCMV tentou nos últimos longos anos) é um direito constitucional. Justamente por este motivo, a moradia digna a TODOS é algo a ser observado pelo estado.
Poderia esperar de um amigo leigo numa conversa de praça, de um taxista embebido na cultura tradicional, ou até de um jornalista que tem que dizer a pauta de grandes emissoras que se portam como querem sem aferir minimamente a lógica constitucional que deveria a priori ser respeitada. Mas de um governador não! Um governador não deveria reduzir a tragédia humana dos que não tem habitação no seu Estado a sentenças como: “Devemos convencer as pessoas a não morar desses jeito” se o Estado em que governa não garante outro jeito DIGNO. O problema de um morador de São Paulo, seja ele o Silvio Santos ou o anonimo da cracolândia, é antes de mais nada um problema de São Paulo, pois afeta a todos — Seja o Silvio Santos querer obstruir com um empreendimento a paisagem do projeto da Lina Bo Bardi, seja o anônimo morador da cracolândia ali largado pelos cantos.
Mas voltando ao tema:
A imensa maioria das pessoas não são Sem Teto porque querem, imigrantes pobres não são sem teto por que querem, o são porque em geral a fortuna do sistema não sorriu pra eles minimamente. Morar sem teto não é uma escolha do tipo: Vou para aquela ocupação morar com minha família ou compro uma casa nos Jardins? Não é esta a regra de vida que estas pessoas tem.
Ao mesmo tempo, todas as edificações hoje ocupadas estiveram lá por anos a fio a espera do nada, sem cumprir um item básico de qualidade urbana da cidade — A Função Social da Propriedade. Repare uma conta simples: Uma revitalização do centro degradado de SP estruturada e tendo como pilar a garantia do direito a moradia DIGNA aos mais pobres produziria:
- qualidade a todos os que andam por São Paulo, pois significaria a revitalização do centro da cidade.
-Garantia de moradia aos mais pobres próximo a locais de maior estratégia de vida (lazer, emprego, educação).
- Garantia de uso destes elefantes brancos que são os imensos vazios urbanos que estas edificações se tornaram muito antes de estarem ocupadas. Incluindo neste a garantia de uso das infraestruturas urbanas ali instaladas.
Claro que para isso, precisaríamos consolidar instrumentos importantes de técnica, como por exemplo:
Uma rede de arquitetos e urbanistas que garantam a assistência técnica necessária a famílias que não podem pagar por esta. Garantindo assim o direito a arquitetura e a cidade com mais qualidade acessível a toda a população e não apenas aos que podem pagar.
Um corpo multidisciplinar de planejadores urbanos que não desenhem a cidade, ou melhor as regiões metropolitanas visando apensar os interesses econômicos de alguns privilegiados que vivem da especulação de terras e imobiliária. Entre outros.
Mas esta é uma função que caberia, a meu ver, ao governador eleito e ao prefeito eleito. Eles tem ferramentas a sua mão para isso. O Brasil não precisa mais daquele raciocínio que imperou até as décadas de 70 de criminalização da pobreza e da miséria, e o aguardo de que as tragédias ocorram para os seus governantes virem a público falar que era uma tragédia anunciada. Já se tem instrumentos de sobra e experiencias concretas pelo mundo do que dá e não dá certo de resolver nestes casos. Um primeiro passo do governador poderia ser: sentar com diversos movimentos de ocupação, pesquisadores sobre a cidade e metrópole, outros interessados da sociedade civil e abrir um diálogo constante sobre a cidade, as metrópoles e os caminhos para o futuro das sociedades urbanas.
Estes processos são simples?
Não, não são, porém são muito mais corretos que transformar a pobreza humana em um crime social, e culpar o pobre por morar em “condições não dignas” de moradia, enquanto os governos não usam os instrumentos LEGAIS para garantir a função social das propriedades abandonadas no Centro de SP.
Este processo é mais correto do que um governador considerar que já estava diante de uma tragédia anunciada e esperou esta tragédia acontecer para apresentar a opinião pública que a solução é convencer as pessoas que elas não podem estar ali.